...uma situação inusitada. Já depois de ter me despedido de todos os que me acompanharam até o aeroporto e entrado na área de embarque, faltando 10 minutos para o avião sair, o anúncio: “Vôo 2209 cancelado, manutenção imprevista na aeronave!”. Obviamente aquele anúncio pouco me afetou, pois eu não sabia o numero do meu vôo mesmo. Esperei os 10 minutos e quando a porta de acesso aos aviões se abriu lá fui eu mostrar meu bilhete e a moça da entrada me diz: “seu vôo foi cancelado, você tem que descer ao chek in”.
Claro, mesmo não sabendo o número do meu vôo, deveria ter suspeitado que seria o meu, como poderia ser diferente?
Enfim, descem os passageiros, os “trouxas” segundo o nativo do nosso ex-destino (São Paulo). Lá embaixo o funcionário da TAM aparece e anuncia a sentença: "vôo cancelado e transferido para meio dia" (quando deveria sair as 2:40 da manhã), "taxi e hotel por nossa conta!" – imaginem a nossa cara de felicidade... Taxi e hotel...
Os tais trouxas, no meio dos quais eu estava inserido, se amontoavam ao redor do pobre funcionário da Cia aérea. Tenho quase certeza que alguém que passasse neste momento pelo segundo piso do aeroporto e tivesse uma vista aérea daquela cena teria a clara impressão de que ali se estava jogando uma partida de futebol americano, e o tal funcionário estava segurando a bola com todas as suas forças, embora estivesse louco para arremessá-la tão longe quanto pudesse.
No entanto, em alguns segundos a imagem passou de futebol americano para quebra de bolsa de valores, cada um dos "trouxas" argumentava o porquê não poderia permanecer ali até o meio dia, nem tampouco se sentiam compensados por um taxi e uma diária de hotel a mais na cidade do mar azul piscina.
Entre inúmeras vozes que se podia ouvir, uma ou outra se destacava ou pelo nível de dramaticidade ou pelo nível de altura.
A primeira a obter destaque foi a de um escrivão alagoano, que havia, segundo ele, juntado dinheiro por três anos, para realizar um sonho: assistir a uma corrida de Fórmula 1 em Interlagos. Havia pagado R$ 2.800,00 em um ingresso, dado 3 plantões seguidos para conseguir os dias de folga necessários para ir a SP e voltar. Neste ano, realizaria seu sonho, assistiria a corrida, e mais, assistiria a última corrida do ano, em que um brasileiro, pela primeira vez na história, poderia ser campeão no Brasil.
Realizaria seu sonho…
até ser transformado em trouxa!
Com o vôo saindo meio dia, chegaria a Cumbica (que fica do outro lado da cidade, em relação a Interlagos) às 16:00 mais ou menos, devido ao horário de verão (a viagem duraria por volta de 3hs), e a corrida começaria às 15:00.
Uma senhora também conseguiu destaque na multidão. Viajava com 3 filhos adolescentes, ambos dependentes químicos e sob efeito de fortes medicamentos, tinham uma consulta marcada para 8:00 da manhã. Seriam internados logo depois. As vagas na clínica, muito difíceis de conseguir, já estavam reservadas.
Neste momento, suspeito que os tais remédios começavam a fazer efeito (ou a perder), pois os moleques começavam a agir de forma estranha. Ou estavam sofrendo de algum efeito colateral, ou de alguma síndrome de abstinência, ou ainda faziam parte de um grupo de atores que já estavam de saco cheio de Maceió e montaram prontamente um espetáculo. Para nos fazer de trouxas, por conseguinte… mais do que já éramos…
Um casal, mais ao canto, quase chorava, diziam que tinham conseguido uma vaga em um curso que só acontece de 5 em 5 anos. Eles teriam que chegar a SP, pegar um ônibus, e depois um barco, específico para levar os participantes do curso, e exclusivo, pois não existiria, segundo eles, transporte para a região que aconteceria o curso, e que, obviamente, não esperaria 5 horas os trouxas atrasados. Mais uma vez, ou estes dois estavam realmente em apuros, ou tínhamos nem uma partida de futebol, nem um quebra de bolsa, mas sim uma conferência de atores.
- Tenho trabalho!
- Tenho escola
- Tenho filhos
- Tenho fome
- Tenho vontade de matar esse engravatado que não resolve nosso problema
Enquanto tudo isso acontecia, uma estudante de direito anotava tudo o que via e ouvia, pedia documentos impressos emitidos pela Cia aérea, solicitava assinaturas, mas caindo em falácia advertia: “não adianta entrarmos com processo nenhum. Não se ganha nunca!” Assim, segundo ela, disse seu professor.
E a minha voz, era quase muda, tamanha a incredulidade de estar passando por aquela situação. Só falava em pé de orelha com algum funcionário explicando meu caso e buscando solução. Teria conexão internacional de SP para Roma, e com o vôo saindo ao meio dia eu a perderia…
Mas, sem dúvida, a voz que mais chama atenção é a de um senhor, que para ser melhor visto e ouvido sobre no balcão de Check in, e entre lágrimas e gritos, esbraveja: “meu pai está morto!” “estou indo para seu enterro! Alguém pode entender isso?” “MEU PAI SERÁ ENTERRADO ESTA MANHÃ! NÃO TENHO O DIREITO DE ME DESPEDIR DELE?”
…
A voz deste homem foi tão forte que conseguiu calar todas as outras.
Silêncio…
Diante desta cena, os problemas de cada um pareciam não ser mais tão grandes assim e muitos começaram a aceitar a proposta de passar a noite em Maceió, outros, que moravam na cidade, foram se retirando, a situação foi se acalmando, a senhora que passava mal já estava melhor, a fila que os trouxas eram obrigados a pegar para retirar o ticket do taxi e hotel foi eliminada com outro balcão exclusivo e assim se foi…
O problema para estes, agora, era pegar o taxi, pois os poucos taxistas que estavam no aeroporto ou se escondiam sabe-se lá deus onde, ou se negavam a levar os, agora, ainda mais trouxas. Isto porque a TAM só paga estes serviços de 30 em 30 dias, então para eles não era muita vantagem.
A solução, finalmente, foi o surgimento, sabe-se lá também deus de onde, de um ônibus, que levou quase todos de uma só vez.
Por fim, as vozes que falaram mais alto, incluindo aquela que calou todas as outras e excetuando o alagoano escrivão, conseguiram ser encaixadas em algum vôo.
Sobraram então, no aeroporto, eu e os dois ex-futuros expectadores do Grande prêmio do Brasil, o alagoano e um paulista, que voltaria a sua aterra, mas não ao circuito de Interlagos
nem tão cedo.
O Grande prêmio do Brasil, para nós, era a bagunça do seu sistema de transporte aéreo...
Seja bem vindo!
Este é o blog de mais um aspirante a símio!
Algumas das imagens presentes nos posts são links para assuntos afins.
Algumas das imagens presentes nos posts são links para assuntos afins.
domingo, 23 de novembro de 2008
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Ei Renan fale sério.. qntas hrs vc demorou para criar tds os personagens? ehehehhe
ResponderExcluirIncrível como a vida às vezes nos prega cada uma q parece mais uma ficção! Mas estando no Brasil... realmente tudo é possível!!!
Só por aqui mesmo pode acontecer casos como esse, parece mais aquele filme...
ResponderExcluir...aquele...
(esqueci o nome do filme e o nome do ator principal)
...mas é aquele que o car fica preso no aeroporto no States por vários dias.
hauhauahua
ResponderExcluiré com o Tom Hanks, e o filme chama "O terminal"
acabei de entender o que o Rafa disse sexta... hehehe
ResponderExcluir